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segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Augusto Bastos


Augusto Bastos O Angolano Prodigioso

campa no cemitério de Benguela...


 Augusto Bastos O Angolano Prodigioso 
Augusto Bastos é um dos mais ilustres angolanos de sempre.
Foi ao mesmo tempo jornalista e homem de letras, filólogo, historiador, etnólogo, compositor, pianista, artista plástico e o mais brilhante advogado e político do seu tempo.
As suas ideias libertárias estiveram na base das revoltas do Seles e Amboim, tendo sido preso pela polícia na sua casa de Benguela, no dia 2 de Junho de 1917, de madrugada, sob a acusação de ser o líder do movimento.

A figura de Augusto Bastos foi enaltecida numa obra de Geraldo Bessa Victor, um dos percursores do Movimento Vamos Descobrir Angola, e numa nótula histórica de Alberto de Lemos, grande historiador angolano.
Era filho de um abastado comerciante português estabelecido na cidade de S. Filipe, Manoel Thadeu Pereira Bastos, e “da preta Lauriana”, cuja ascendência se desconhece mas que era oriunda do Seles.
Augusto Bastos nasceu em Benguela, no dia 16 de Setembro de 1873. Pelo menos é essa a data que consta na lápide colocada na campa rasa onde está sepultado. Mas Geraldo Bessa Victor, que tinha laços familiares com essa grande figura da nossa História, afirma que ele nasceu em 16 de Agosto de 1872.
A data da sua morte não oferece dúvidas. Morreu no dia 10 de Abril de 1936, fulminado por um ataque cardíaco, na sua casa de Benguela. O jornal “O Intransigente”, de Gastão Vinagre, publica um obituário pungente onde é referido que morreu um dos mais ilustres angolanos de sempre.
A biografia traçada por Alberto de Lemos refere que Augusto Bastos “foi dos mais ilustres filhos de Angola que, na última década do século passado (Sec. XIX) até ao primeiro quartel deste (Sec. XX), aqui, neste meio africano, ingrato e hostil, mais se distinguiu”.
O grande historiador, que assina uma “História de Angola” (1932) das mais probas e honestas sobre a chegada dos portugueses à foz do rio Zaire e a ocupação colonial, tinha inteira razão.
Augusto Bastos ainda criança revelou ser um menino-prodígio. O pai não perdeu tempo e enviou-o para Lisboa, onde fez os estudos primários, secundários e os preparatórios para a Universidade, tendo-se matriculado no curso de Medicina.
Mas a morte do pai obrigou-o a abandonar a carreira estudantil e regressou a Benguela para tomar conta dos negócios da família. Em Lisboa, como todos os meninos ricos da época, aprendeu música, pintura e línguas.
Teve uma professora de piano e aulas de canto. Falava e escrevia correctamente o francês. Com um mestre particular, aprendeu Belas Artes. Apesar de muito jovem, frequentava todas as instituições culturais e científicas da época. Foi um destacado aluno de Matemática e a paixão por essa ciência acompanhou-o até ao fim dos seus dias.
O cientista francês Camile Flammarion publicou estudos matemáticos sobre o Cometa Halley. Augusto Bastos, que era correspondente em Angola e sócio de várias instituições científicas, analisou os cálculos e descobriu que estavam errados.
Através da Sociedade de Geografia de Lisboa, da qual era membro, fez chegar ao cientista francês a correcção dos erros que cometeu. Camile Flammarion enviou-lhe uma carta a aceitar os erros e a agradecer-lhe as correcções.
E mostrou “vivo interesse” em conhecer tão ilustre matemático. Nessa altura, Augusto Bastos era um jornalista que impôs um estilo no jornalismo angolano e um escritor notável. 
Este episódio teve grande repercussão na época porque circulava uma espécie de lenda, segundo a qual Augusto Bastos era apresentado como alguém que apenas tinha a “quarta classe”, o que de resto é referido em muitos documentos da época e sobretudo em notícias de jornais.
Na verdade ele teve uma esmeradíssima educação, que lhe foi dada por alguns dos melhores professores que davam aulas particulares em Lisboa, no último quartel do século XIX, e que lhe transmitiram os ideais liberais, republicanos e até libertários.
Literatura policial
Augusto Bastos regressou a Benguela quando tinha 17 anos e pouco depois começou a revelar a sua prosa magnífica nos principais jornais de Luanda. Em apenas cinco anos, impôs o seu estilo único, numa prosa perfeita, muito incisiva e impregnada de um humor contagiante.
Durante uma década, os seus textos eram disputados pelos melhores jornais de Luanda e de Benguela. Sem nunca abandonar completamente o jornalismo, começou a dedicar-se, com grande sucesso, à literatura. As suas crónicas, muito poéticas, já indiciavam o nascimento de um grande escritor angolano.

E nasceu mesmo, numa vertente surpreendente. Augusto Bastos foi o primeiro angolano a escrever uma obra no géneropolicial. O título é “Aventuras Policiais do Repórter Zimbro” e foram publicadas seis novelas. São ficções muito raras, escritas numa prosa enxuta e ao mesmo tempo de uma imaginação delirante.
E sempre, como fio condutor, o finíssimo humor dos benguelenses, traço que nada nem ninguém conseguiu apagar até hoje. Ele ainda está vivo na prosa de Pepetela (Jaime Bunda) ou do cronista Jaime Azulay, naquela que é uma crónica lapidar, publicada neste jornal sob o título genérico de “Morro do Sombreiro” e conta as atribulações de um pinguim desterrado.

Para que ninguém tenha a tentação de ligar o “Repórter Zimbro” ao “Repórter X”, de Reinaldo Ferreira, lembro que o prodigioso jornalista português nasceu em 1897, quando Augusto Bastos já era o mais notável jornalista angolano da sua época. A haver afinidades, foi Reinaldo Ferreira que lhe seguiu os passos.

Além desta obra fez o que todos os grandes escritores faziam na época, folhetins no jornal O Lobito, novelas em fascículos para toda a imprensa da época e muitas crónicas.
Já se sabe que a crónica angolana está muito mais próxima da literatura do que do jornalismo, como bem mostra o grande mestre Arnaldo Santos, nesta sua última série “Observatório do Balão”, rubrica semanal no “Jornal de Angola”, temporariamente suspensa porque o autor está a escrever um romance.

Augusto Bastos é autor de outros livros muito raros mas que ainda se encontram nos alfarrabistas de Lisboa: “O Caçador de Leões” (1917), “Debaixo de um Búfalo” (1919), dois fascículos que foram publicados sob o título genérico “A Vida nas Selvas”. Há um terceiro fascículo, “A Vingança e o Fim de um Escravo”, que desapareceu, até dos alfarrabistas. Talvez a família conserve algum precioso exemplar.

O mais importante da obra de Augusto Bastos está nas áreas da filologia e da etnografia. Deixou-nos um compêndio de umbundu, que na época era chamado de “quimbundu de Benguela”. Mais uma obra perdida.
Mas na Sociedade de Geografia de Lisboa estão depositados o “Novo Método da Língua Bunda do Distrito de Benguela”, a “Monografia de Catumbela” e a sua obra mais notável, “Traços Gerais sobre a Etnografia do Distrito de Benguela”, de 1909. Neste livro, Augusto Bastos inclui os seguintes capítulos: da pronúncia e ortografia do umbundu, povos, governo político, organização guerreira, direitos civis, julgamento dos crimes e delitos, recursos económicos, principais cerimónias, crenças e superstições, usos e linguagem.

Estudar esta obra é conhecer Benguela e o espírito indomável dos benguelenses.
Músico e pintor
Augusto Bastos era um exímio pianista e um compositor de elevado mérito. Compôs sinfonias (perdidas?), cançonetas (muitas) e valsas, com destaque para a famosa “As Furnas do Lobito”. A Benguela do seu tempo era um farol cultural.
E Augusto Bastos pontificava nos saraus, tocando piano, declamando poemas, fazendo conferências de improviso. A sua obra musical é desconhecida do público.
Geraldo Bessa Victor diz que ele era um pianista excepcional e um compositor invulgar. A família é chamada a mostrar aos angolanos a obra musical deste angolano de excepção.
Nos 12 anos que viveu em Lisboa, Augusto Bastos teve aulas particulares de artes plásticas.
A pintura, sobretudo a óleo, foi uma paixão que, a par do jornalismo, o acompanhou sempre.
Geraldo Bessa Victor dá-nos conta que entre inúmeras telas de sua autoria, se destacam os retratos de Teófilo Braga e António José de Almeida, dois visionários da República com os quais Augusto Bastos conviveu e, muito provavelmente, conspirou em Lisboa, nas tertúlias republicanas.
Investigação Histórica
Em 1928, o alto-comissário de Angola, Norton de Matos, deu a Augusto Bastos a missão de criar o Arquivo Histórico de Angola. Foi o seu último trabalho de grande fôlego, mal remunerado e nada respeitado. Porque quando o alto-comissário foi substituído, o novo governador desvalorizou o trabalho.
Mas Augusto Bastos já tinha inventariado e catalogado mais de dois mil processos. O trabalho foi metido numa cave, longe do palácio, abandonado aos ratos e à salalé.
Anos mais tarde, o que restou desta preciosa documentação foi para o Museu de Angola, hoje Museu de História Natural. Alberto de Lemos, a propósito desta catástrofe cultural, escreve na biografia de Augusto Bastos: “o que se pôde salvar do tremendo naufrágio está hoje recolhido com carinho no Museu de Angola”.
Enquanto fazia o trabalho de investigação, Augusto Bastos produziu um manuscrito com toda a bibliografia angolana, desde que foi instalada a imprensa em Angola. As bibliotecas municipais de Luanda e de Benguela, duas casas de cultura de importância excepcional, tinham cópias do manuscrito. Eu próprio consultei a de Luanda. O original esteve em posse de Alberto de Lemos, que o depositou no Museu de Angola.

As autoridades que guardam o espólio de Augusto Bastos fazem um relevantíssimo serviço à cultura angolana se publicarem o manuscrito.
Intelectual revolucionário
Augusto Bastos era um homem de esquerda, republicano e socialista. Em Benguela foi sempre um líder político, tendo sido presidente da Câmara Municipal. No seu mandato, as ruas foram arborizadas e foram criados inúmeros espaços verdes.
Foi com ele que nasceu a Cidade das Acácias Rubras. Sendo um homem da “kuribeka”, durante a sua presidência foram abertas escolas e garantida a saúde pública. Um dia o governador-geral demitiu-o porque temia a sua influência entre “os nativos”.

O seu passado de revolucionário fez com que o regime colonialista o olhasse sempre com desconfiança. No dia 2 de Junho de 1917, de madrugada, a polícia assaltou a sua casa e levou-o preso, sob a acusação de ser o líder da revolução do Seles e Amboim. Com ele foram presos outros intelectuais benguelenses. Mas como a revolta estava a atingir Benguela, o governador teve de libertá-lo.

Neste período e ao mesmo tempo, rebentaram as revoluções do Libolo, Lucala e Dala Tando (Ndalatando). Os intelectuais do norte, António de Assis Júnior, Domingos Van-Dúnem, Filipe de Melo, Pedro Duarte e José Fontoura foram presos, torturados e levados para Luanda amarrados. As autoridades colonialistas estavam a decapitar as elites africanas, para evitar que a revolta alastrasse.

Muito ficou por dizer sobre esta figura extraordinária da História de Angola. Mas acabo com uma perplexidade. Sendo Augusto Bastos um nacionalista revolucionário, o Senado da Câmara Municipal de Luanda deu o seu nome a uma rua que ligava as Ingombotas à Maianga e ao Maculusso.
Fonte:Jornal De Angola/06-04-2010

1 comentário:

  1. Parabens por teres colocado no teu blog este artigo sobre um GRANDE Catumbelense, AUGUSTO BASTOS. Sou detentor de um livro que um dia descobri num alfarrabista em Lisboa. A Monographia de Catumbella publicado em 1912, pela Sociedade de Geographia de Lisboa.
    Podes encontrar a digitalização na minha pagina
    http://www.facebook.com/note.php?note_id=10150089493208421
    Abraço
    Luiz Vasco

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